Luanda (Angola) – Três dias de manifestações iniciadas em julho por motoristas de táxi contra o aumento do preço dos combustíveis resultaram na morte de pelo menos 30 pessoas e na prisão de milhares, segundo dados divulgados por autoridades e organizações civis. Os confrontos, que começaram em bairros populares da capital Luanda e se espalharam para outras províncias, tornaram-se a maior onda de protestos desde o fim da guerra civil, em 2002.
Ruas foram bloqueadas com pneus em chamas, lojas sofreram saques e ocorreram choques diretos entre manifestantes e forças de segurança. Até hoje, moradores das zonas mais afetadas evitam falar publicamente sobre os acontecimentos por medo de represálias, diante das detenções realizadas durante e após os distúrbios.
Juventude sem emprego lidera manifestações
A taxa oficial de desemprego entre jovens de 15 a 24 anos chega a 54%. Dos 18 milhões de angolanos em idade produtiva, apenas 3 milhões possuem emprego formal. Essa realidade foi apontada pelo sociólogo Gilson Lázaro como o principal combustível dos protestos: “São jovens que não têm mais nada além da própria vida, por isso foram às ruas sem medo”, afirmou.
Um vendedor ambulante de 24 anos, que pediu anonimato, contou que participou do primeiro dia de atos para “mostrar que também temos voz”. Ele vende refrigerantes na Avenida Pedro de Castro Van-Dúnem Loy e enfrenta meses sem renda fixa. “Vivemos assim e ninguém nos escuta. Por isso não podemos ficar calados”, disse.
Críticas à gestão econômica
Desde que assumiu em 2017, o presidente João Lourenço prometeu combater a corrupção e diversificar a economia. Contudo, críticos afirmam que a inflação anual, hoje em torno de 18%, e a crise do custo de vida anulam os avanços. Levantamento do Afrobarometer indica que 63% da população considera que a situação econômica piorou no último ano.
Economista Francisco Paulo vê má gestão da receita petrolífera como raiz do problema: “Se seguíssemos modelos que usam o petróleo para fortalecer outros setores, seria uma bênção; aqui, o dinheiro se perde em gastos sem valor agregado”. Segundo o Banco Mundial, mais de um terço dos angolanos vive com menos de US$ 2,15 por dia.

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Resposta do governo
Em pronunciamento nacional em 1º de agosto, Lourenço classificou os atos como “praticados por cidadãos irresponsáveis, manipulados por organizações nacionais e estrangeiras antipatrióticas”. O Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) governa o país desde a independência, conquistada em 11 de novembro de 1975.
Independência sob tensão
Enquanto se preparam festividades para marcar os 50 anos de independência — entre elas shows, condecorações presidenciais e até um amistoso de futebol com Lionel Messi —, estudantes como Lea Komba, 20 anos, alertam para o risco de novos protestos até as eleições de 2027. “A desigualdade é enorme. Quem mora nas periferias pensa com o estômago vazio, porque não tem mais nada a perder”, declarou.
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Com informações de BBC News